DA UNICIDADE
O amor não é
cobra de duas cabeças
O amor verdadeiro
são duas pessoas
por inteiro
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O amor não é
cobra de duas cabeças
O amor verdadeiro
são duas pessoas
por inteiro
Quem reside em casa alugada
precisa manter os pertences embalados
roupas livros
discos filmes
coisas sem valia comercial
que se leva de moradia em moradia
uma andança de rua em rua
sem dia marcado
sem lugar predileto
sem cadeira de balanço
para o descanso
que se alcança
na hora final
Para a última mudança
o último chão
também precisa manter
o corpo embalado
para ser colocado
em um caixão
---
Ilustração: Despejo, por Elena Ospina
Não tenho mais volta
que esqueci os caminhos
De que adianta um mapa
das ilhas bem-aventuradas
se tudo está mudado
Seguir em frente
nada é como antes
Seguir em frente
não há revolta
nem meia-volta
Seguir em frente
por caminhos diferentes
por mares nunca dantes
navegados
Seguir em frente
sem desamor
nem desfeita
das coisas feitas
nem amargor
do desencantado
Seguir em frente
pelo gosto
do nunca visto
vale mais que
o dessabor
de um café requentado
Morrer por morrer
prefiro a incerteza
da louca visão
de distante oásis
o verdejante oásis
da fonte cantante
que o monótono
descanso
em um cemitério
de elefantes
---
Ilustração: Cemitério de Elefantes Domésticos, por Luiz Alberto Borges da Cruz
Menina vamos brincar de boneca
de médico e médica
Ai menina no rito de passagem
na doce aparência da adolescência
vamos aprender o ABC do amor
brincar de se esconder
em encantados esconderijos
Ai se a vida fosse uma brincadeira
você não perderia esse jeito de menina
o corpo adolescente em flor
Ai menina não deixe o tempo correr
--
Ilustração Balthus
Uma folha seca
em uma seca árvore
no Sertão
Uma leve brisa
te tange
para longe
E vás rolando
pelo chão
até que a terra
te cubra
Se existe outra vida
da terra ressurjas
Da terra ressequida
que espera a chuva
Deitado na sombra da árvore
o velho leão lembra os tempos de caça
Lindas gazelas pastavam na verde planície
Na verde planície
que as areias do deserto
empurradas pelo vento
foram cobrindo
A pata doída o velho leão
sente não tem força
para afastar um enxame de moscas
que lhe sugam as feridas
Preciso fugir
do presídio
que construí
neste enfermo
mundo:
O suplício
de um suicídio
lesmo e doloroso
nos ermos campos
do abandono
e do medo
Preciso encontrar a paz
o amor
Sentir quanta alegria
no irmão Sol
quanta poesia
na irmã Lua
Andarilho descalço
seguir pelos caminhos
da irmã Pobreza
Na poeira das estradas
nos pedregulhos
no adusto chão
descobrir a beleza
da natureza
a beleza intrínseca
às coisas simples
Sentar na beira de um regato
e ouvir o silêncio dos peixes
Quedar extático
ante a presença de Deus
no quebradiço arbusto
e na fúria dos raios
Descalço andarilho
pelos apertados caminhos
da irmã Pobreza
a esperança de possuir
a leveza dos pássaros
a fiel mansidão
de um boi de cambão
amar o próximo como um irmão
seguindo o exemplo
de São Francisco de Assis
despojado das vestes de seda
foi mais feliz que um rei
__
Ilustração: "Casamento de São Francisco com a Senhora Pobreza", por Stefano di Giovanni (ou Sasseta), período gótico italiano (1392-1450)
Não existe o antes nem o depois
O que está acontecendo
se foi
nas asas de um beija-flor
Fugindo do passado
tempo sumido
perdido tempo
somos eternos viajantes
eternos errantes à procura
de um porto seguro
no futuro
Somos errantes
eternos andantes
de uma alongada
curta jornada
Somos sozinhos
eternos errantes
nunca saberemos
entre tantos caminhos
se estamos percorrendo
a via real
Na peregrinação para Lourdes
Mariazell Santiago de Compostela
pelos caminhos de Jerusalém
continuaremos sozinhos
sempre esperando
o convite amigo Vem
Vem comigo
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